O pentecostalismo não é um apêndice do Evangelho
No ano passado o instituto Pew Research apresentou o resultado de uma pesquisa realizada na América Latina, apontando que a maioria dos protestantes nessa região identifica-se com o Pentecostalismo. Em 18 países e em Porto Rico, 65% de protestantes diz pertencer a uma igreja que é parte de uma denominação pentecostal, ou identifica-se pessoalmente como um cristão pentecostal, independentemente de sua denominação.
Esse
fenômeno, chamado pelos especialistas de “pentecostalização”, também
faz parte da realidade brasileira. Afinal, o crescimento da população
evangélica no Brasil deve-se em grande parte ao desenvolvimento das
igrejas de tradição pentecostal. Segundo o Censo/IBGE de 2010 seis de
cada dez evangélicos são de igrejas pentecostais, representando o grupo
que mais cresceu em relação ao Censo de 2000: passaram de 10,4% em 2000 para 13,3% em 2010.
Se por um lado esses dados nos trazem alegria, com a constatação do florescimento do pentecostalismo moderno - a
partir de 1900, nos Estados Unidos, por Charles Parham, prosseguindo
para Los Angeles (na famosa Azusa Street, 312), em 1906, com Willian
Joseph Seymour e, finalmente, Chicago, em 1907, com Willian Durham, e
depois no Brasil, nos idos de 1910 - por outro, nos chamam também à
responsabilidade para o resgate do pentecostalismo clássico, diante do
surgimento de práticas, doutrinas e experiências que destoam dos seus
postulados bíblicos originais.
Na obra Panorama do Pensamento Cristão Gregory J. Miller escreve que “acentuando
a experiência de Deus na conversão e também uma dotação especial pelo
Espírito Santo para o serviço e ministério cristãos (Atos 2.4; 1
Coríntios 12), os pentecostais trouxeram energia para o evangelismo e
missões mundiais”[1]. Miller ainda diz que:
“devido à forte ênfase em missões, os movimentos pentecostais e carismáticos são agora numericamente maiores fora dos Estados Unidos que dentro. Isto não só tem ajudado a formar a cosmovisão cristã pela “desocidentalização” do cristianismo, mas também legou uma fé vibrante e sobrenatural ao cristianismo global nesta conjuntura importante da história do mundo”.[2]
De igual modo, Rick Nañes assevera que o
movimento pentecostal-carismático é um fenômeno, e como corrente
eclesiástica que nos dias de hoje acha-se entrelaçada no tecido de
muitas nações. De acordo com Nañes, “sua
influência tem ajudado a preencher o vazio espiritual frequente de
centenas de milhares, trazendo esperança e provendo um escape pelo qual
se torna fácil ter uma experiência direta com Deus”[3]. E mais: “Sem
sombra de dúvida, o movimento pentecostal-carismático está cumprindo
papel decisivo no resgate de multidões das águas congeladas da religião
convencional, muitas vezes morta”.[4]
Todavia,
o pentecostalismo não deve ser visto simplesmente como “movimento” ou
“fenômeno” religioso, caracterizado tão somente pela vivacidade na
pregação, pelo “poder no Espírito” ou por seu dinamismo missionário,
estribado – apenas e tão somente – na experiência, sem fundamentos
teológicos e interpretação bíblica consistente. Erroneamente, há quem
afirme, como lembrou Gary McGee, que “o Pentecostalismo é um movimento à
procura de uma teologia, como se não estivesse ele radicado à
interpretação bíblica e à doutrina cristã”. Ciente dessa realidade, o
pentecostalismo tem pegado o caminho do fortalecimento teológico, e por
isso, como afirmam James H. Railey Jr e Benny C. Aker, em sua maior
parte, a teologia pentecostal encaixa-se confortavelmente nos limites do
sistema evangélico.
Somente
por meio do fortalecimento bíblico-teológico o pentecostalismo poderá
afastar dos seus arraiais as principais ameaças modernas à sua
identidade, a saber: o misticismo como fuga da realidade sociocultural; a
experiência hedonista e egocêntrica como busca do êxtase espiritual; a
antiintelectualidade como aversão ao saber epistemológico; o legalismo e
o esquecimento das bases da sua teologia da salvação.
Para
tanto, é preciso entender que o pentecostalismo não é um apêndice ou
uma versão diferenciada do Evangelho. Ele faz parte do Evangelho do
Reino e, como tal, a ele se submete, extraindo os fundamentos e
princípios básicos, em sintonia com a tradição cristã.
Logo, um pentecostalismo genuinamente bíblico é também um Pentecostalismo Cristocêntrico. Cristo
é a primeira credencial do seu próprio Evangelho. Nem mesmo os mais
importantes personagens bíblicos representam o fundamento do
Cristianismo, a não ser o próprio Cristo. Ele é o fundamento, a
viga-mestra, a pedra de esquina da fé cristã. Quando menosprezamos o
senhorio e a soberania de Cristo sobre todas as coisas, desfazemos o
cristianismo, transformando-o em uma religião comum (Cl 1.15-17; Fp.
2.9-11; Hb 1.1-2)
Em segundo lugar, o pentecostalismo é bíblico e ortodoxo. Segundo Railey e Aker, os
pentecostais levam a sério a operação do Espírito Santo como
comprovação da veracidade das doutrinas da fé, e para outorgar poder à
proclamação destas. Esse fato leva frequentemente à acusação de que os pentecostais se baseiam
exclusivamente na experiência. Tal acusação não procede; o pentecostal
considera que a experiência produzida pela operação do Espírito Santo acha-se abaixo
da Bíblia no que tange à autoridade. A experiência corrobora, enfatiza e
confirma as verdades da Bíblia, e essa função do Espírito é importante e
crucial”[5].
Por essa razão, os autores citados dizem que é importante que o pentecostal tenha uma base e um ponto de referência realmente bíblicos e pentecostais[6]. Primeiro,
deve crer no mundo sobrenatural, especialmente em Deus, que opera de
forma poderosa e revela-se na história, na existência dos milagres e nos
outros poderes no mundo sobrenatural, quer angelicais (bons), quer demoníacos (maus), penetram em nosso mundo e aqui operam[7]. “O pentecostal não é materialista nem racionalista, mas reconhece a realidade da dimensão sobrenatural”[8].
Desse
modo, para superar a falsa compreensão do movimento pentecostal é
necessário resgatar o ensino da Palavra e incentivar o ensino teológico
de qualidade. Conforme o título do livro de Osiel Gomes, precisamos de
“Mais palavra, menos emocionalismo”[9].
Há muito sentimentalismo, espetáculo e confissão positiva sendo
propagado em alguns púlpitos e causando danos à igreja, sob o falso
título de “mover do Espírito” e pentecostalismo.Por:Damiana Sheyla