Uma empresa do esquema de lavagem de dinheiro montado pelo doleiro Alberto Youssef, preso pela Polícia Federal durante a Operação Lavo-Jato, no mês passado, manteve negócios com a Delta Construções, de Fernando Cavendish. Esta empresa planejava fazer prospecção de petróleo na Bacia de Santos por meio de uma offshore, também pertencente a Youssef, sediada em Hong Kong.
A Malga Engenharia foi constituída em 26 de dezembro de 2012, primeiramente em Arujá, na Região Metropolitana de São Paulo, e, depois, transferida para a periferia da capital paulista. O capital inicial da empresa era de R$ 900 mil e tinha como sócios Adriano Roberto e Carla Zorron Lopes, com divisão de cotas iguais. O objetivo da companhia, de acordo com a Junta Comercial de São Paulo, era a prestação de “serviços de engenharia, obras de terraplenagem, locação de automóveis sem condutor e aluguel de máquinas e equipamentos agrícolas sem operador”.
Em 25 de setembro do ano passado, a Malga fez uma alteração contratual. Saiu Carla Zarron e entrou a GFD Investimentos Ltda, cujo endereço é o mesmo de Alberto Youssef. A GFD passou a figurar na sociedade com participação de R$ 891 mil, enquanto Adriano Roberto ficou com apenas R$ 9 mil. O representante da GFD é Carlos Alberto Pereira da Costa, tido pela Polícia Federal como empregado de Youssef.
Contratos de R$ 115 milhões no Dnit
A Malga Engenharia foi subcontratada pela Delta para obras de recuperação da BR-163. A construtora de Cavendish obteve um contrato do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes Terrestres (Dnit) para obras no trecho de 63 quilômetros entre os municípios de Marechal Cândido Rondon e Guaíra, no Paraná. O valor dos serviços foi de R$ 114,6 milhões, que contemplavam a recuperação da pista, de 44,95 quilômetros de acostamento, e 12,6 quilômetros de terceira faixa.
A ligação entre a Malga e a Delta foi possível graças a ações trabalhistas impetradas pelo advogado Euro Trento em defesa de alguns funcionários que eram contratados pela primeira. Profissional no Paraná, Trento foi localizado pelo GLOBO no Piauí, para onde se mudou recentemente. Ele disse que entrou com os processos contra a Malga, tendo a Delta como subsidiária, uma vez que era a empreiteira de Cavendish a detentora do contrato original com o Dnit. Ele afirmou que a Malga fazia um trabalho de acabamento na rodovia.
— Tivemos ganho de causa no ano passado. A empresa está pagando parceladamente. Alegaram que passam por dificuldades financeiras — disse.
Durante a CPI do Cachoeira, descobriu-se que a Delta Construções servia como escoadouro de milhões de reais que, segundo as investigações, eram utilizados para pagamentos de propinas e desvios de dinheiro público. A partir da Delta, a PF encontrou um laranjal de empresas fantasmas, que tinham como única função receber e repassar recursos para agentes públicos. A Delta acabou considerada inidônea pela Controladoria Geral da União e impedida de firmar contratos com o governo federal.
Uma destas companhias fantasmas, como informou a revista “Época” há dez dias, era a RCI Software, que surgiu agora também, no cruzamento de dados feito pela PF na Operação Lava-Jato. Duas outras empresas (JSM Engenharia e Terraplenagem e Rock Star Marketing), que receberam R$ 49,1 milhões do esquema de Cavendish, teriam sido destinatárias de R$ 1,5 milhão da MO Consultoria Comercial e Laudos Estatísticos, ligada a Youssef.
A PF descobriu que a MO Consultoria tinha como sócio formal o mesmo proprietário da RCI Software. Pela conta da MO, conforme a PF, passaram R$ 90 milhões, de 2009 a 2013. O “Correio Braziliense” informou sexta-feira que que a Rock Star repassou, em junho e julho de 2010, ano eleitoral, R$ 1,2 milhão para a MO Consultoria. Em 2007, a empresa recebeu R$ 2,3 milhões da Delta. Em 2008, foram R$ 7 milhões.
Apesar de, oficialmente, ter como objeto social a prestação de serviços de engenharia e locação de veículos e máquinas agrícolas, a Malga Engenharia firmou um contrato, em julho de 2013, com a Legend Win Enterprises, com sede em Hong Kong, para estudos de prospecção de petróleo na Bacia de Santos. O valor do contrato, segundo cópia obtida pela PF à qual O GLOBO teve acesso, é de US$ 11 milhões, e a duração da sociedade iria até julho de 2016. O representante da Legend Win é Leonardo Meirelles, sócio da Labogen, um laboratório que estava fazendo negócios com o Ministério da Saúde, num contrato de R$ 150 milhões — mas que, segundo o ministério, não foi adiante. O deputado licenciado André Vargas (PT-PR) é suspeito de ter ajudado justamente a Labogen, de Youssef, a obter contratos com o Ministério da Saúde.
A PF não tem dúvidas de que a Malga pertence ao esquema de Alberto Youssef. “A empresa Malga Engenharia é igualmente controlada por Leonardo Meirelles e Alberto Youssef, conforme abaixo será exposto. Destaque-se que trata-se (sic) de empresa de fachada, cuja imagem do endereço da mesma encontra-se abaixo e que não parece, prima facie, sediar uma empresa com capacidade para atuar em prospecção de petróleo, podendo indicar que o contrato tenha sido utilizado para justificar o ingresso de recursos estrangeiros no Brasil para a Malga Engenharia”, descreve o relatório da Polícia Federal.
O GLOBO entrou em contato com a Delta na sexta-feira. Foi orientado a enviar um e-mail com as dúvidas, mas as perguntas não foram respondidas.
Postado Por:Daniel Filho de Jesus